O debate sobre terras raras voltou ao centro da agenda internacional após os Estados Unidos anunciarem tarifas sobre importações vindas da China e o Brasil se movimentar para atrair investimentos externos para explorar suas reservas. Embora o país possua grandes jazidas desses minerais estratégicos — usados na fabricação de turbinas eólicas, carros elétricos e smartphones —, a realidade ainda é de forte dependência de importações.
Estudos da Agência Internacional de Energia (IEA) estimam que a demanda global por terras raras deve triplicar até 2040, impulsionada pela transição energética e pela eletrificação da mobilidade. Hoje, a China concentra cerca de 60% da produção mundial e 85% da capacidade de refino, o que deixa países como o Brasil em posição vulnerável frente a crises geopolíticas e barreiras comerciais.
O Brasil tem reservas expressivas, mas não consegue transformar esse potencial em produção efetiva. Na prática, seguimos importando ímãs de neodímio e outros insumos de países como China e Mianmar, arcando com tarifas, volatilidade cambial e riscos logísticos.
Ímãs de neodímio: insumo invisível, mas essencial:
Derivado das terras raras, o neodímio é a base para os ímãs permanentes de alta potência, presentes em carros híbridos e elétricos, turbinas de energia eólica, hard disks, alto-falantes, aparelhos médicos e até em sistemas militares de alta precisão.
Apesar de invisíveis para o consumidor final, esses ímãs estão no coração da economia verde e digital.
Cada carro elétrico pode demandar até 2 kg de ímãs de neodímio. Já uma turbina eólica de grande porte utiliza entre 600 kg e 1 tonelada. Isso mostra o tamanho da oportunidade que o Brasil está deixando passar ao não estruturar uma cadeia local de terras raras.
Gargalos da importação:
Nos últimos anos, eventos como a pandemia, restrições ambientais na China e instabilidade política no Mianmar expuseram a fragilidade da dependência externa. Para empresas brasileiras, isso significa altos custos, atrasos no fornecimento e incerteza no planejamento industrial.
Durante a pandemia, vimos o preço do neodímio disparar mais de 100% em alguns períodos, e muitas indústrias nacionais ficaram à beira da paralisação. A ausência de produção nacional torna o Brasil refém do mercado externo.
Oportunidade estratégica para o Brasil:
O país possui reservas significativas em Estados como Amazonas, Goiás, Bahia, Minas Gerais, Piauí e Tocantins, mas carece de tecnologia para o refino — etapa que concentra maior valor agregado. Sem essa etapa, as jazidas nacionais perdem competitividade no mercado global.
Especialistas apontam que o desenvolvimento de uma cadeia de terras raras poderia posicionar o Brasil como fornecedor estratégico em um setor avaliado em mais de US$ 13 bilhões anuais e com crescimento acelerado.
Não basta extrair, é preciso processar e transformar em produtos finais de alto valor. O Brasil já é referência em mineração, mas ainda engatinha em refino de terras raras. Isso limita nossa capacidade de competir e de reduzir a dependência da importação.
Um ativo para a indústria nacional:
Na visão do especialista, uma política industrial que incentive a exploração e o processamento de terras raras poderia fortalecer toda a cadeia produtiva brasileira. A indústria de tecnologia, energia e mobilidade elétrica precisa desses insumos. Se tivéssemos produção nacional, não apenas reduziríamos custos e riscos, mas também poderíamos abastecer outros mercados.
Enquanto o debate avança em Brasília e nos corredores de negociações internacionais, a realidade é que o Brasil ainda precisa importar praticamente todo o volume de ímãs de neodímio e terras raras que consome. Um movimento que garante, por ora, o funcionamento da indústria, mas que expõe a vulnerabilidade do país diante de um mercado cada vez mais estratégico — e disputado.
Fonte: Rodolfo Mídea - especialista em importação e CEO da Fácil Negócio.
