A cada hora, cerca de 20 denúncias de violência e maus-tratos contra pessoas idosas são registradas no Brasil. São relatos de agressões físicas, psicológicas, financeiras, entre outras, que, em sua maioria, ocorrem dentro do próprio lar. O que deveria ser espaço de proteção se transforma, para muitos, em território de medo e vulnerabilidade.
Entre 1º de janeiro e 9 de junho de 2025, o Disque 100 registrou mais de 75,4 mil denúncias de violações de direitos contra pessoas com 60 anos ou mais, sendo 25% dos casos concentrados no estado de São Paulo. Em todo o país, são quase 500 casos por dia, segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.
A maior parte dessas vítimas é composta por mulheres (63%) e a faixa etária mais atingida vai dos 70 aos 84 anos. Além disso, quase 90% das agressões acontecem no domicílio da vítima ou do agressor, em um ciclo que mistura silêncio, dependência, vergonha e, muitas vezes, omissão das autoridades. É comum que essas situações permaneçam invisíveis até que se tornem incontornáveis.
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania editou recentemente a Portaria nº 938/2025, que determina prioridade no atendimento das denúncias envolvendo pessoas com mais de 60 anos. A norma prevê atenção especial aos maiores de 80, além da criação de um formulário específico no Disque 100 e fluxos para garantir acolhimento humanizado, triagem de risco, orientação e encaminhamento imediato.
Medidas como essa são muito bem-vindas, mas não bastam. É preciso garantir efetividade. Isso exige capacitação contínua dos profissionais que acolhem as demandas, protocolos claros, linguagem acessível e uma abordagem empática, que evite a revitimização e assegure uma resposta rápida e adequada.
O sistema de Justiça também precisa estar alerta. Juízes, promotores, defensores, procuradores e servidores públicos devem ser sensíveis aos sinais de violência contra idosos. Maus-tratos, retenção de rendimentos, isolamento social e intimidações não podem ser ignorados nem relativizados.
Monitorar a implementação da portaria é parte dessa resposta. A criação de indicadores e o acompanhamento de sua efetividade são igualmente necessários para que o arcabouço legal não se torne apenas uma formalidade.
Mas o enfrentamento à violência contra idosos vai além da atuação estatal. Envolve a construção de uma cultura de respeito e valorização da pessoa idosa em todos os espaços, isto é, na família, nas instituições, na mídia, nas escolas e nas comunidades. É preciso desnaturalizar práticas abusivas, fomentar redes de apoio e estimular a denúncia como ato de cuidado.
O Junho Violeta é um marco simbólico dessa proteção aos idosos, mas isso não pode se limitar ao calendário. Envelhecer com dignidade não é um privilégio, é um direito. E garantir esse direito é uma obrigação da sociedade, do Estado e de cada um de nós.
E se as estatísticas estiverem corretas, enquanto o leitor lia este artigo, ao menos uma nova denúncia de violência contra uma pessoa idosa foi registrada. Que essa leitura não termine em silêncio.