Reduzir desperdícios, prolongar o ciclo de vida dos produtos e transformar resíduos em novos recursos. Esse é o princípio da economia circular, um conceito que vem ganhando força no mundo e que, para muitos especialistas, representa uma revolução industrial em andamento.
Sustentada por avanços tecnológicos, pela urgência ambiental e por novas demandas econômicas, a economia circular redefine os pilares da produção e do consumo. Assim como as revoluções industriais anteriores, esse modelo está modificando setores inteiros, exigindo novas regulamentações e transformando hábitos sociais.
No Brasil, a aprovação da Política Nacional de Economia Circular (PNEC) sinaliza um passo importante nessa trajetória. Com 18 objetivos e mais de 70 ações previstas para a próxima década, o plano aposta em incentivos financeiros, investimentos em educação, tecnologia e na ampliação da infraestrutura para reciclagem e reaproveitamento de materiais.
Segundo dados da Ellen MacArthur Foundation, a economia circular pode movimentar até US$ 4,5 trilhões na economia global até 2030, criando novos mercados em áreas como remanufatura e logística reversa.
- Moda em transformação:
A indústria da moda está no centro desse desafio. aponto que no setor têxtil e de confecção, a maior perda ocorre ainda na etapa da mesa de corte, que pode chegar a 30% do material, mas o problema mais grave está no descarte pós-consumo.
A economia circular contribui ao promover o redesenho completo da cadeia, desde o design até o pós-venda. Pensando no presente, a especialista destaca ações que visam a reinserção de resíduos na produção, como a reciclagem de tecidos, a logística reversa, o upcycling, o aluguel de roupas e o recommerce (mercado de segunda mão). Essas estratégias permitem que materiais descartados retornem como matéria-prima à cadeia produtiva.
Já olhando para o futuro, o foco está em evitar a geração de resíduos desde a concepção. Isso inclui o uso do ecodesign, passando por processos produtivos ecoeficientes, que minimizam desperdícios e otimizam o uso de insumos e recursos naturais, além da modelagem e corte baseados no conceito zero waste.
Outro ponto essencial é a transparência na cadeia produtiva, que deve ser garantida por meio de rastreabilidade, certificações e informações acessíveis ao consumidor.
Desafios e oportunidades no Brasil:
Apesar dos avanços, a adoção da economia circular no Brasil ainda enfrenta algumas barreiras estruturais, tecnológicas e culturais. Entre os gargalos estão a falta de infraestrutura para uma logística reversa eficiente, incentivos econômicos e regulatórios insuficientes, e tecnologias de reciclagem ainda limitadas, principalmente devido à dificuldade em separar misturas de fibras e uma metodologia de separação majoritariamente mecânica.
Além disso, o modelo de consumo acelerado, característico do fast fashion, e a escassez de profissionais qualificados em design circular e gestão de resíduos dificultam a transformação. Poucos cursos focam em economia circular para o setor têxtil, o que cria um déficit importante na capacitação.
Tendências globais para inspirar a indústria brasileira:
No cenário internacional, especialmente na Europa, novas tecnologias e matérias-primas vêm sendo exploradas, como fibras derivadas de resíduos de abacaxi, laranja, leite e fungos, além do uso de bactérias e enzimas para fabricar corantes naturais. Tecnologias inovadoras como impressão 3D para produção sob demanda e sistemas de rastreabilidade baseados em blockchain também ganham espaço.
O Brasil tem um enorme potencial a partir de sua biodiversidade e da força da agroindústria, responsável por cerca de 25% do PIB nacional. Os resíduos gerados por essa cadeia poderiam ser transformados em matérias-primas sustentáveis para a moda, integrando setores, reduzindo desperdícios e criando novos mercados.
Fonte: Camila Costa - consultora técnica em sustentabilidade e ESG do SENAI CETIQT.