Seguindo essas máximas, que naturalmente são falaciosas, poderíamos também sugerir que somos todos apaixonados por juros altos (para consumo, não para investimentos). A bem da verdade, não gostamos, mas é inevitável dizer o quanto ele se faz presente no nosso dia a dia. Um levantamento recente do site MoneYou mostrou que o Brasil permanece em segundo lugar no ranking dos países com as maiores taxas reais do mundo. No nosso caso, a taxa é de 6,79% ao ano. Estamos atrás somente da Rússia, onde esse percentual alcança os 8,91%.
Isto, é claro, ajuda a promover uma cultura nefasta que corre às margens da taxa de juros, que é a prática de juros abusivos. Talvez a maioria das pessoas logo associe com os juros do cartão de crédito, cujos índices superam os 800% ao ano. Mas esses absurdos também são vistos em financiamentos de veículos e de imóveis, em contratos de créditos consignados e em créditos pessoais.
Estes são apenas alguns exemplos da teia de juros sanguinários encontrados no mercado. Aliás, aplicá-los é algo tão recorrente que obriga o próprio Código de Defesa do Consumidor (CDC) a regulamentar os limites para o que se pode considerar um juro dentro do aceitável. O Art. 51 do CDC simplesmente anula cláusulas contratuais que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”, como se coloca no Inciso IV.
Na prática, isto implica uma regulação às transações comerciais estabelecidas entre o fornecedor do produto ou serviço e o consumidor, mediante imposições contratuais. Por isso, a lei funciona como uma proteção contra a desvantagem exagerada que signifique um desequilíbrio contratual que exceda os riscos de prejuízos ao consumidor. A força da lei faz-se ainda mais relevante nessas circunstâncias porque a prática de juros acentuados não apenas é injusta e um ato de má-fé como também é nociva à economia de modo geral.
Não é tão difícil encontrar casos assim, mas a justiça brasileira costuma ser enérgica contra organizações financeiras que aplicam juros significativamente superiores à média do mercado, fugindo daquilo que se pode identificar no contexto econômico e da própria razoabilidade comercial. Por isso, é importante que o consumidor recorra aos caminhos legais capazes de coibir a prática de adoção de juros abusivos.
Um desses caminhos é o Procon, o órgão legítimo de proteção ao consumidor. Mas há também a possibilidade de resolução direta do problema, por meio de negociação com a empresa, ou, em último caso, através de ação judicial. Em ambos os casos, é essencial que o cliente esteja amparado por profissionais do direito especializados nesse tipo de conflito.
É preciso ter em vista que uma relação comercial saudável consiste na prevalência de valores que devem ser recíprocos por todas as partes envolvidas, como a boa-fé, a equidade, a transparência, o respeito aos direitos, a legalidade, a responsabilidade e a confidencialidade. Alcançar todas essas prerrogativas torna-se imperioso à medida em que se tem em conta que o papel dos juros não é de inviabilizar as obrigações do consumidor. Algo que, claramente, não é compreendida por toda a parcela do mercado.