Planejar é preciso, pois viver é preciso


O título é uma singela adaptação da célebre citação latina “Navigare necesse, vivere non est necesse” – navegar é preciso, viver não é preciso –, que em sua forma original foi imortalizada por poetas como Francisco Petrarca, Fernando Pessoa e musicalmente por Caetano Veloso.

O planejamento evita o denominado “apagar incêndios”, contexto no qual são adotadas medidas somente após a consumação de um ato ou fato e de forma desordenada, ocasionando sempre maiores gastos e a obtenção de resultados paliativos ou adversos. Ao planejar algo, busca-se antever uma situação, ato ou fato que se entenda possível a sua ocorrência, seja em curto, médio ou longo prazo. 

Não é exercício de achismo, deve-se, ao contrário, utilizar adequadamente informações úteis, complementadas por experiências já vivenciadas, objetivando a criação de prováveis cenários que contemplem expectativas futuras, positivas ou negativas.

Caso se concretize o cenário e este abarque uma situação adversa aos objetivos e metas, como delineado, o planejamento deve ter indicado em sua estrutura, os meios necessários para que se evite o dano em sua integralidade, ou ao menos, minore os seus efeitos.

Caso concretizado o cenário e este carregue consigo benefícios ou corrobore com objetivos e metas, como delineado, o planejamento conterá em seu arcabouço as orientações essenciais a obtenção de melhor e maior proveito, gerando assim os maiores e melhores resultados possíveis. É comum que possam surgir situações não previstas e inesperadas durante a execução, neste caso, após o processo de análise, deve-se promover adaptações e correções necessárias.

Essencial ao bom planejamento é o orçamento. Ele contempla variáveis qualitativas e quantitativas. As primeiras consistem nas descrições pormenorizadas de planos e ações. Já as segundas são pautadas pelas informações relacionadas aos valores e volumes de recursos – e suas prováveis fontes ou origens – necessários à consecução dos planos e ações citadas. Ainda requer conhecimento pleno sobre a empresa, entidade pública, pessoa ou família a quem se destina, neste último caso no orçamento doméstico.

Pessoas, empresas e governos devem planejar. No caso destes últimos, é obrigatório por imposição constitucional. É essencial, principalmente, em razão da escassez de recursos, que agora é acentuada mundialmente pela pandemia. Todo planejamento deve ao menos contemplar: a) a que ou a quem se destina; b) uma análise profunda de situações ou cenários, que deve ser pautada pelo maior número de informações úteis possíveis; c) convicção de qual contexto se almeja, onde se deseja estar ou chegar; d) objetivos possíveis e claros, seja no curto, médio ou longo prazo; d) estabelecimento de metas, ou seja, a quantificação dos objetivos, tempo ou prazo para atingimento; e) acompanhamento e aferição, preferencialmente, de forma concomitante a execução; f) a alocação adequada de recursos humanos e materiais que devem ser demandados de forma suficiente, sem excessos ou escassez; g) a avaliação e emissão de relatórios e estudos, visando o controle e criação das bases para o novo planejamento.

Vivenciamos, constantemente, as frágeis e equivocadas ações do governo, que denotam falta de planejamento ou sua inadequação. Ações que, em sua maioria, buscam somente frutos políticos e eleitoreiros imediatos ou não. Além dessa nefanda forma de proceder, aloca-se na condução das ações, pessoas nem sempre qualificadas, mas consagradas a exercer tal função em razão da proximidade do grupo político ou de certa categoria funcional, que dá suporte ao gestor, que, agindo assim, transforma o público em particular. O planejamento governamental deve visar todos e possuir amplo alcance social.

É inadmissível viver de incertezas quanto a formulação, implementação e, principalmente, aos efeitos de políticas públicas, resultando na prestação de serviços de má qualidade ou na indisponibilidade dos mesmos. Cito, apenas a título de exemplo, dentre tantos, a recente interrupção abrupta de fornecimento de energia elétrica no Amapá. Essa situação evidenciou fortemente a falta de planejamento do governo para a solução de problemas que já se anunciavam há tempos e até então nunca haviam recebido a atenção necessária. A ausência de um projeto bem definido e organizado também se traduziu na demora do reparo e volta da prestação do serviço.

Sabemos da existência de vacinas com capacidade imunizatória comprovada, outras em fase avançada de testes e até existem países que já estão as utilizando. Em um cenário positivo, estima-se que no Brasil, a vacinação ocorra ainda no início de 2021. Possuímos, desde 1973, um estruturado programa nacional de imunização, operacionalizado via Sistema Único de Saúde (SUS).

Há, portanto, tempo hábil para que o governo federal coordene e prepare campanha de vacinação nacional, mediante um planejamento que contemple todos os entes federados e as diversas variáveis, como os recursos materiais e humanos, a logística de conservação, distribuição etc. Isso permitirá que toda a população alvo seja atendida de forma satisfatória, sem percalços. Planejar, portanto, é preciso, pois viver é preciso.

Fonte: Menildo Jesus de Sousa Freitas - contador, professor da Faculdade Milton Campos, mestre em Ciências Contábeis, membro da Academia Mineira de Ciências Contábeis e perito contador do Ministério Público da União