A sociedade mundial retoma o poder e assume um compromisso pelo clima


Neste momento histórico, todos sentem na pele a importância de tomar medidas baseadas na ciência e em metodologias consolidadas.

E a ciência, hoje, é clara. Vivemos uma crise climática mundial. Continuar ignorando os impactos da emissão de gases de efeito estufa, que crescem indiscriminadamente por todo o planeta, é dar adeus às próximas gerações e à vida como conhecemos.

Lá se foram mais de 40 anos desde a primeira conferência da ONU sobre mudança climática, em 1979. Já se passaram, também, mais de 25 anos da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. E o mundo continua longe – quase tão distante como sempre – de qualquer ação climática séria.

Em 2013, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) expressou que nós contribuímos com 95% a 100% do aumento da temperatura do planeta. E a sociedade continua cobrando ações concretas, que enfrentam os interesses econômicos e políticos contrários a qualquer causa ambiental.

Com a pandemia, a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP26 – que deveria ser decisiva para o limite de 1,5°C de elevação da temperatura –, foi adiada para novembro de 2021, marcando a inércia de qualquer iniciativa.

As emissões da China já se recuperaram além dos níveis pré-Covid. No Brasil, as taxas crescentes de desmatamento e os incêndios na Amazônia apontam para outro problema: não estamos nem perto de cumprir as metas do Acordo de Paris para 2020.

Na verdade, as emissões de carbono no país não caíram, mas aumentaram 9,6%, em 2019, o primeiro ano do mandato de Jair Bolsonaro.

As mudanças climáticas continuam acelerando, e as negociações institucionais e governamentais não estão produzindo as mudanças necessárias na mesma velocidade. Os movimentos que enfrentam esse problema entenderam que só esperar que as soluções venham dos governos, nada mais é do que contribuir com a indiferença e impotência das instituições supostamente criadas para salvar o clima.

Destes movimentos, surge o conceito de ação direta e mobilização pela justiça climática que pretende tomar a solução em nossas mãos, criando uma agenda climática justa que reduza efetivamente as emissões de gases de efeito estufa e impeça que grandes corporações petrolíferas, automobilísticas, siderúrgicas, mineradoras, farmacêuticas e agrícolas continuem promovendo injustiça social e ambiental como modelo de negócios futuros.

O Acordo de Glasgow, que foi assinado esta semana por mais de 50 organizações de mais de 20 países e 3 continentes, chega para estruturar a estratégia de ação do movimento social pela justiça climática e promover maior cooperação internacional entre movimentos.

Ao mesmo tempo, ao olhar para além da COP26, o acordo reconhece o poder da sociedade e das organizações do movimento mundial pela justiça climática.

Há uma necessidade urgente de ação climática por parte de nossos governos? Sim, são suas responsabilidades. Mas não dá mais para continuar aguardando decisões institucionais e burocratizadas. Assim, o Acordo de Glasgow visa retomar a iniciativa de governos e instituições internacionais sobre ação climática.

Para implementar o Acordo de Glasgow, as organizações se comprometem a produzir inventários de emissões de gases de efeito estufa de atividades existentes e futuras, que irão informar uma agenda para a justiça climática. Esses inventários serão especialmente relevantes para o desenvolvimento de estratégias de ação para reduzir as emissões.

O Acordo de Glasgow é um compromisso estratégico e coletivo das pessoas com a tomada de medidas decisivas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. É dar um basta em declarações vazias e assumir que a impotência das instituições não pode se tornar a impotência dos movimentos.

Fonte: Nicole Oliveira -diretora do Instituto Internacional Arayara, uma das organizações que representam o Brasil na iniciativa mundial.