Estudo revela como modelo de desenvolvimento urbano afeta diretamente o ar que respiramos




Um estudo inédito conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR) revelou que um mesmo metal, em concentrações idênticas, terá diluições diferentes em fluído pulmonar a depender do tipo de cidade que se mora. Na prática, a pesquisa alerta que determinados elementos químicos presentes na poluição atmosférica, emitidos por fontes de poluentes atmosféricos, em concentrações similares, podem chegar a corrente sanguínea e causar diferentes impactos na saúde a depender do modelo de desenvolvimento urbano adotado pela cidade.

O estudo foi publicado recentemente no periódico Scientific Reports, pertencente ao grupo NATURE. Para chegar à revelação, os pesquisadores realizaram uma análise da bioacessibilidade dos elementos químicos que usualmente são associados ao risco de câncer, entre outras doenças (cobre, cromo, chumbo e manganês). 

"Fizemos a investigação com material particulado obtido no ambiente, e não de fontes específicas como, por exemplo, uma indústria ou apenas fonte veicular. Coletamos o material particulado real, misturado, que as pessoas de fato respiram", explica Theotonio Pauliquevis, professor do Departamento de Ciências Ambientais da Unifesp e coautor do estudo.

As amostras foram coletadas em Manaus, na região Amazônica, e Curitiba, na região Sul do país. "Essas cidades foram escolhidas justamente por terem diferentes localizações geográficas, climas e estratégias de desenvolvimento urbano. Manaus impulsiona sua industrialização por meio da política da zona de livre comércio e Curitiba adota uma economia centrada em serviços impulsionada por sustentabilidade", descreve Pauliquevis.

Ao comparar as amostras de particulado atmosférico das duas cidades e dissolvê-los em fluído pulmonar artificial, os pesquisadores identificaram que elementos como cobre, cromo e chumbo tiveram solubilidade muito diferentes. 

"Cromo e chumbo tiveram solubilidade bem mais alta quando usadas as amostras de Manaus. Em Curitiba, houve solubilidade mais alta de cobre, fruto do distinto modelo urbano de desenvolvimento e industrialização", destaca o professor da Unifesp. 

"Essa diferença de solubilidade é devido ao fato de que são diferentes as fontes que emitem cada um desses metais nas duas cidades que participaram do estudo. Em Manaus, por exemplo, à época da amostragem, havia um predomínio de termoelétricas próximas produzindo eletricidade. Já em Curitiba, a cidade basicamente é alimentada por hidroeletricidade", explica o professor da Unifesp.

- Necessidade de governança e de fiscalização:

Como os motores que giram as economias de cada cidade e cada região permanecerão em funcionamento, são dois os caminhos para minimizar os efeitos nocivos da poluição atmosférica: governança, por parte da iniciativa privada, e fiscalização, por parte dos órgãos competentes.

De acordo com o professor Theotonio Pauliquevis, "sem governança, fiscalização e pesadas multas não há como controlar a poluição. É verdade que houve progresso ao se estabelecer níveis de poluentes específicos nas normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente. Entretanto, a legislação tem que ser sempre atualizada, os emissores de poluentes fiscalizados e as multas aplicadas. Afinal, sem monitoramento, as emissões podem ser altíssimas", alerta o pesquisador.

"Esse cuidado vale não apenas para as duas cidades onde o estudo foi baseado, mas para todas, independentemente da região e do porte. É notório que a socioeconomia, a localização geográfica e a estratégia de desenvolvimento urbano têm um impacto profundo na qualidade do ar. As consequências do contínuo desenvolvimento urbano e do crescimento desequilibrado são a perda de áreas verdes, o aumento da densidade de tráfego, da demanda de energia e da industrialização, bem como da geração de resíduos. O efeito combinado dessas consequências resulta em baixa qualidade do ar, o que evidentemente tem um impacto negativo na saúde humana", conclui Pauliquevis.


Fonte: Theotonio Pauliquevis - professor do Departamento de Ciências Ambientais da Unifesp e coautor do estudo.