Esgotamento do modelo rodoviário brasileiro




O prático esgotamento do modelo rodoviário brasileiro se comprova pelo tempo extra de viagem, em comparação à fluidez de poucos anos atrás. A duração das viagens urbanas, praticamente dobrou a triplicou. Não nos irritávamos tanto na avenida.

Em deslocamentos entre cidades, o fato comum era pé no acelerador, ponteiro de velocidade que parecia colado na altura dos 100 km por hora. Atualmente, deparamo-nos com fileiras de caminhões a baixa velocidade. Não raro, em ambas as faixas da pista dupla. Ficamos na dúvida se existe no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) qualquer exigência de velocidade mínima quando se está na faixa da esquerda de pista dupla. 

A imagem de filas e mais filas de caminhões parece estar a clamar pelo que realmente falta no Brasil dos transportes: mais recursos para fazer renascer a ferrovia. E ferrovia é para carga, principalmente. Linhas para trens de alta velocidade são inimigas do trem de carga. Lento, mas eficaz. Lento, mas passível de liberar espaço nas rodovias e de nos devolver a liberdade de ir e vir no território brasileiro. 

Ferrovia convencional libera rodovias do excesso de carga, aumentado sua capacidade para o tráfego de automóveis e ônibus. Este modelo é mais democrático do que trem de alta velocidade, inimigo de composição de carga. Ferrovia convencional é amiga de trens de carga e de passageiros. 

Devolve a liberdade ao motorista porque tira carga da rodovia. Qual é o problema? Simples. Esgotou o modelo de transporte brasileiro que colocou no altar o rodoviarismo. Qual é a solução? Um modelo multimodal, no qual o transporte, de passageiros e cargas, seja efetuado por veículos e vias, segundo hierarquia de tipo, distância, volume e valor. 

Para passageiros urbanos, ônibus em vias exclusivas, bicicleta e o andar a pé. Nas metrópoles, metrô e veículo leve sobre trilhos (VLT) a complementar este modelo. VLT, ainda presente na memória de grisalhos brasileiros, na forma do bonde. Trafega até hoje em antigas linhas urbanas, como em Lisboa e Bruxelas, com silenciosos e confortáveis novos veículos. 

Para tráfego entre cidades, rodovias desafogadas do excesso de caminhões, cuja carga se transporta por ferrovias convencionais. Desonerando rodovias do tráfego pesado de caminhões, o pavimento dura mais. Automóveis não causam dano estrutural ao pavimento. Ônibus? Poucos danos causam. 

Há dúvida nisto? Automóveis pagam meia no pedágio, porque não consomem pavimento. E onde os motoristas de caminhão trabalham? Na ferrovia, é a resposta. Experimentam horário regular. Não buscam desesperados artifícios para não dormir, porque não têm mais nota fiscal com horário carimbado. Jornada de trabalho humana e com menos riscos. Para completar este modelo, transporte fluvial e marítimo. 

Marítimo, com fomento a portos de profundidade maior e custo operacional menor. Fluvial, com visão auto-sustentável e de recursos múltiplos, aplicada a bacias como a do rio Amazonas ou do rio São Francisco, que não pode prescindir de qualquer metro cúbico de água em projetos duvidosos de transposição, evitando que processos de assoreamento sepultem sua memória, ícone da cultura nordestina. 


Fonte: Creso de Franco Peixoto é engenheiro civil, mestre em Transportes e professor do Curso de Engenharia Civil do Centro Universitário da FEI (Fundação Educacional Inaciana).