Imposto sobre consumo é fator estratégico na reforma tributária


A reforma tributária, tão premente quanto negligenciada desde a promulgação da Constituição de 1988, há 29 anos, ressurge no Congresso Nacional. A atual proposta do relator da reforma tributária, deputado federal Luiz Carlos Hauly, que extingue sete tributos federais (IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins e salário-educação), o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), substituindo-os pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), o Imposto Seletivo e a Contribuição Social sobre Operações e Movimentações Financeiras, é uma das concepções que se aproxima das que têm sido preconizadas ao longo do tempo pelos setores produtivos e por especialistas no tema.

O Governo Federal, embora tendo apoiado essa iniciativa parlamentar, já atenuou o cronograma, anunciando alterações no PIS/Cofins no primeiro semestre e o início da reforma do ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), nos últimos seis meses do ano. Espera-se que o terremoto político que sacode Brasília não adie, mais uma vez, a revisão de nosso sistema tributário com uma reforma da dimensão do problema a ser tratado.

Feita a ressalva, é importante entender que, qualquer que seja a proposta que venha a ser adotada, ela deve ter uma base técnica e politicamente consistente, que garanta sua sustentação, eficácia e atenda às necessidades contemporâneas atreladas à cobrança de impostos pelo Estado.

Em nossa visão de agentes fiscais de renda, o conjunto de dez princípios que defendemos para o sistema tributário brasileiro vai garantir a natureza técnica dos tributos, para responder aos desafios do desenvolvimento sustentado e da justiça social. O imposto que queremos está baseado nos seguintes princípios: garantir os recursos para o bom funcionamento do Estado; não atrapalhar a economia; ser a porta de entrada para a cidadania; ser simples e transparente; favorecer o equilíbrio federativo; oferecer segurança jurídica para os negócios; estimular o cumprimento espontâneo das obrigações tributárias; fechar portas para a corrupção; inibir a sonegação; e aproximar o fisco da sociedade. 

Esse é o cerne do Movimento VIVA, criado a partir de uma parceria inédita da Associação dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo (Afresp) com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), visando defender princípios integrados para a criação de um Brasil economicamente forte e socialmente justo.

Esses dez pontos são essenciais para que o sistema tributário brasileiro responda à necessidade de crescimento do PIB e atenda — finalmente! — aos princípios constitucionais basilares da justiça fiscal: equidade e capacidade contributiva. Nosso atual arcabouço de impostos está muito distante de estimular a economia e mais ainda dos preceitos contidos na Constituição de 88, em especial no tocante à redução das disparidades regionais e de renda e erradicação da pobreza.

Nesse contexto, o ICMS (Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), por ser incidente sobre o consumo, tem papel estratégico. O primeiro ponto a ser lembrado é que se trata de tributo indireto, embutido no preço de produtos e de alguns serviços (combustíveis, energia elétrica e comunicações). É, portanto, pago pelos consumidores finais.

Outro item muito importante a ser levado em conta é o fim da guerra fiscal, cuja principal munição é justamente o ICMS, pois cada Estado legisla livremente sobre ele, concedendo incentivos na busca de investimentos, sem qualquer coordenação e sem atender a uma política nacional de desenvolvimento regional. 

O Conselho Federal de Política Fazendária (Confaz), constituído pelos secretários de fazenda de todos os Estados e do Distrito Federal e presidido pelo ministro da Fazenda, há muito tempo não consegue cumprir sua missão de equilibrar e conferir equanimidade às alíquotas do ICMS. 

É preciso reforçar o papel do colegiado e “limpar” todos os itens de exceção que se foram acumulando em cada Estado, que tornam quase impossível aplicar com eficácia e segurança jurídica as regras que regem esse tributo. Sem isso, não há como termos um imposto mais simples, transparente e objetivo.

Finalmente, é necessário que as mudanças, embora devam consagrar a equanimidade e a isonomia, preservem o conceito federativo, mantendo a competência dos Estados sobre o novo tributo. Rever os impostos indiretos incidentes sobre o consumo, a partir de um conjunto de princípios, é fundamental para que eles deixem de ser uma das causas estruturais da baixa produção/produtividade e da insegurança jurídica dos setores produtivos, que tanto restringem nosso desenvolvimento e conspiram contra a inclusão socioeconômica.

Fonte: Rodrigo Spada é o presidente da Afresp (Associação dos Agentes Fiscais de Rendas do Estado de São Paulo).